quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A Tentação de Ser quem Não Sou


“E, tendo jejuado quarenta dias e quarenta noites, depois teve fome; E, chegando-se a ele o tentador, disse: Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães. Ele, porém, respondendo, disse: Está escrito: Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus”

Mateus 4.2-4


Numa terça-feira um jovem veio até mim, pedindo ajuda. Eu via angústia em seus olhos. Ele me disse: Preciso de uma oração. Era algo bem comum, já que eu estava vestindo um colete vermelho que tinha escrito nas costas “Ministério de Intercessão”. Aquele colete fez com que ele olhasse para mim de baixo para cima, como alguém que está num poço e pede ajuda a outro que está num nível muito, muito mais elevado. Como alguém que diz “você pode me ajudar”, ele realmente cria que havia algo na minha oração que a diferenciasse da oração de toda a igreja. Perguntei pelo quê ele queria que eu orasse. Ele olhou para mim como se eu estivesse fazendo uma pergunta inútil, já que, no seu modo de pensar, Deus já me havia revelado. Mas mesmo assim, respondeu: “Eu sou muito impuro. Eu oro, peço a Deus para tirar o pecado de mim, para Ele me encher, mas nada acontece. Eu uso o tempo disponível para jogar vídeo-game ao invés de orar. Eu sei que, se continuar assim, eu irei desviar. Será que Deus não tem misericórdia de mim? Será que Ele vai ficar virando as costas para mim desse jeito?”


Lembro-me que o primeiro aconselhamento pastoral em que fui, com o pastor Pedro, teve as mesmas questões da minha parte. Este gabinete começou a abrir meus olhos para o que está escrito aqui. Foi muito edificante para mim, que vinha de uma igreja legalista e farisaica. E esta culpa acontece praticamente em todos os que freqüentam igrejas legalistas e farisaicas, que colocam a vida espiritual como algo à parte da vida física. E, quando estas pessoas que ouvem mensagens legalistas se deparam com este texto da tentação de Cristo, sobra uma única alternativa: Jejuar quarenta dias. Isto acontece porque o legalista se apega aos ritos e esquece o relacionamento. Assim nasce a religiosidade. A religiosidade tem o seu início em um homem com a consciência pesada que, por falta de entendimento, começa a preferir as obras a fé. A consciência dele é rasa, só o acusa pelo que ele faz exteriormente, mas nunca o acusa pelo que ele pensa ou sente. Jesus, pretendendo acabar com a religiosidade em Israel, pregou a mensagem da profundidade. Ele dizia: “Enquanto você se preocupa em coar mosquitos, você engole camelos! Enquanto você se preocupa em guardar o sábado, o seu coração não consegue descansar! Enquanto você se preocupa em não matar, o ódio já transbordou no seu coração! Enquanto você se preocupa em não adulterar, a cobiça e a lascívia te habitam! Hipócritas! Arranquem o ódio do coração e vocês verão que não irão matar ninguém! Descanse em Deus no seu coração e o sábado será apenas mais um dia, entre sete, de descanso! Arranquem a lascívia de dentro de vocês e o ‘não adulterarás’ será apenas uma conseqüência!”


Enxergando esta mensagem, posterior à tentação, pregada por Cristo, fica impossível crer que Ele se apegou ao jejum para vencer a tentação. Jesus assumiu: Sou homem que não come há quarenta dias e tenho fome. Ele não disse ao diabo que não tinha fome. Aliás, deveria ter muita fome, porque quarenta dias sem comer não é brincadeira. Vejo pessoas “determinando”: “Esta vontade dentro de mim é mentira! Eu nasci de novo! Eu sou nova criatura! As coisas velhas já passaram!” Enquanto isso a vontade vai assumindo proporções megalomaníacas até que a cobiça chegue a um ponto insuportável. Isto porque a pessoa tenta vencer a estas vontades da carne com declarações e determinações completamente independentes de Deus. A santidade vem com o relacionamento com Deus, é fruto de uma vida devocional.


Sem saber disto, pessoas religiosas se tornam um prato cheio para satanás. Ele diz: “Se você fosse filho de Deus mesmo, estas pedras tinham se transformado em algo que saciasse a sua vontade. Se você fosse filho de Deus, nem fome você sentiria. Se você fosse filho de Deus, você não assistiria TV nem jogaria vídeo-game”. Isto pega o religioso de jeito. Ele não sabe o que é. O jejum de Jesus não lhe tirou a fome. Pelo contrário, o deixou faminto. Entretanto, o jejum aperfeiçoou a força de vontade de Jesus (o Jesus 100% homem), para que o versículo “Nem só de pão viverá o homem” se tornasse uma só carne consigo mesmo. Este jejum encarnou verdades bíblicas em Cristo para que João pudesse dizer “O verbo se fez carne e habitou entre nós”. Jesus estava dizendo para o diabo: “Estou com fome sim, porém o fato de ter minhas necessidades atendidas através do uso do poder divino é justamente o que me torna um bastardo, alguém que não tem pai”. Ser Filho de Deus é considerar a Palavra de Deus mais forte que as minhas necessidades. Digo mais: Ser filho de Deus é considerar a Palavra de Deus como supridora das minhas necessidades. Se tenho fome, ela é o meu pão. Se tenho sede, ela é a minha água, que transborda em rios de água viva dentro de mim quando creio nela.


Muitos são atacados desta forma. Se questionam sobre a sua salvação por não conseguirem se libertar de algumas coisas. Crêem que não são filhos de Deus por causa da incapacidade de serem santos. Mas a certeza de que você é salvo vem justamente do fato de você estar lutando contra estas coisas. Precisamos entender que ser filho de Deus não é estar ausentado de necessidades (físicas, emocionais, sexuais, financeiras, mentais ou espirituais). Ser filho de Deus é ter encontrado a fonte que supre todas as necessidades, sem deixar de perceber cada necessidade, distinguindo-as entre elas mesmas. Precisamos percebê-las e assumi-las para que possamos supri-las. Se sei que tenho sede, tomo água. Se sei que tenho fome, como algo. Ele é a água, da qual quem beber jamais terá sede. Ele é o pão, do qual quem comer jamais terá fome. Ele é.


É por isso que, quando Moisés apresenta as suas necessidades e dificuldades com eloqüência, Deus se apresenta como “Eu Sou”. “Eu sou a sua eloqüência; Eu sou a sua santidade; Eu sou o amor dentro de você e sem Mim nada podeis fazer”. À medida que Ele seja dentro de nós, nós seremos fora de nós. À medida que Ele seja santo dentro de nós, nós seremos santos fora de nós. Apresente as suas necessidades a Ele em oração, e Ele irá limpar você. Nem sempre será automático, mas eu te garanto que ela será suprida.


Quanto ao rapaz que pediu oração, não orei por ele. Disse-lhe que não precisava de oração, mas de uma conversa. Disse a ele que as orações dele estavam sendo ouvidas, mas que tudo com Deus é um processo. Se Deus quer relacionamento, com certeza criará situações que lhe obriguem a estar diariamente diante dEle. Este é o Deus de Abraão, de Isaque e Jacó. Este é o Deus de Abraão, que o mantém em um processo de espera por mais de vinte anos para que a promessa se cumprisse, a fim de que a espera Os aproximasse. Este é o Deus de Abraão, que diz “Anda na minha presença e sê perfeito”, como quem diz que a única forma de ser perfeito é esta. Este é o Deus de Isaque, que é abençoado com uma esposa por ir meditar no campo apenas para ser íntimo de Deus, sem nenhuma pretensão no coração. Este é o Deus de Jacó, que transforma o medo de Jacó de ser alcançado por Esaú numa forma de conduzi-lo soberanamente à casa de Labão, onde foi profundamente abençoado; É o Deus que usou a fraqueza de Jacó para cumprir o Seu plano Eterno de gerar uma nação para Si mesmo, uma nação que se relaciona com Ele. Este é o Deus verdadeiro e a vida eterna (Jo 17.3).

0 comentários: